A família, de forma polida mas firme, desencoraja visitas. Não
queremos chocar ninguém que conheceu o meu pai como um grande campeão. O
choque é grande, a gente reconhece”´, diz Gonçalo, 38 anos, um dos
filhos.
Um dos maiores jogadores da história do São Paulo (113 gols em 375
jogos) e do Peñarol (81 gols em 159 jogos) Pedro teve artofia do
mesaencéfalo, doença irreversível e que não admite sonhos. “Nem com um
transplante a gente pode contar porque não há muitos estudos de células
troncos nesses casos”, lamenta Gonçalo.
A comunicação é feita com sinais. O dedo polegar direito foi
levantado em sinal de aprovação quando soube que Ganso havia sido
contratado. “Agora, a gente nem fala muita coisa mais. O São Paulo é o
time dele e ele se emociona muito. Meu pai está consciente de tudo, e
isso é pior É um sofrimento muito grande”.
Há três anos, quando visitei Pedro Rocha para lhe levar o livro
“Tricolor Celeste”, ele ficava em uma cadeira e tinha uma certa
dificuldade para andar. Via futebol o dia inteiro e se disse fã de Ganso
e de Gerrard. Disse que jogava parecido com o inglês.
Conversei com pessoas que o viram jogar e todos disseram que foi uma
acesso de modéstia. Pedro foi melhor, bem melhor que Gerrard. No meu
livro “Tricolor Celeste”, Pablo Forlán, pai de Diego Forlán, assim
definiu Rocha.
“É o maior jogador uruguaio dos últimos 50 anos. Vou dizer como ele jogava”
1 – Caminhava com a bola, pelo meio, e lançava o centroavante,
continuando a correr. Quando recebia a bola, tinha facilidade em marcar
2 – Tocava para um dos pontas e corria para a área. A defesa se preocupava com o centroavante e era ele quem cabeceava
3 – Quando não havia a possibilidade do passe, ele segurava a bola,
chegava perto e chutava muito forte, de 30 metros de distancia. De
esquerda ou de direita, como no final da Copa América de 67, quando
fomos campeões.
4 – Se o ponta esquerda sofria uma falta, Rocha cobrava com o pé direito no canto esquerdo do goleiro.
Com esse repertório, jogou quatro copas do mundo pelo uruguai, de
1962 a 1974. Em seu grande momento, 1970, contundiu-se no primeiro jogo e
ficou de fora. O Uruguai foi quarto.
Gonçalo elogia a ajuda do São Paulo, mas pede um pouco mais. Mais
amor. “O São Paulo poderia fazer um jogo de despedida para meu pai.
Reunir velhos amigos, fazer uma festa para ele ser lembrado uma vez
mais. É bom ser lembrado em vida e não depois”
Um jogo beneficente? “Pode ser, o dinheiro seria muito bem aplicado,
mas o bom seria mesmo pela emoção de se dizer obrigado a um craque como
meu pai foi”.
Pedro Rocha vive com uma aposentadoria de R$ 1800 mensais. A família
gasta o dobro disso com remédios. “Os remédios são caros, as fraldas
geriátricas também. Uma vez por semna uma enfermeira vem trocar a sonda e
isso custa R$ 200″, lamenta Gonçalo.
A ajuda do São Paulo é grande, segundo ele. “Não temos o que
reclamar. O clube paga a cuidadora, paga a fono e a fisioterapia, ele
faz uma hora por dia de cada um. A gente passaria mais dificuldades sem o
São Paulo, mas eu repito, se o clube fizesse um jogo beneficente para
ele, seira uma alegria para o velho”
No dia 15 de dezembro, a Reebok acertará com a família de Rocha o que
é devido pela primeira leva de camisas tricolores e celestes que
homenagearam os quatro grandes uruguaios – Rocha, Forlán, Lugano e Dario
Pereyra – e a família está ansiosa. “Soubemos que as vendas foram muito
boas. Eles vão nos pagar 10%, podemos arrecadar um dinheiro necessário
para cuidar bem do pai”, diz o filho Gonçalo.
Quando um craque chega ao ocaso em dificuldades, é lugar-comum
acusações de que a decadência financeira veio a reboque de lindas
mulheres e velozes cavalos. E carros. Quando pergunto a Gonçalo, ele
sorri, com tristeza e diz que com o Verdugo nada disso aconteceu.
“Pergunte a Muricy, que conviveu com ele. Sempre fez questão de dizer
que meu pai sempre foi um grande homem. O que aconteceu foi que Pedro
Rocha foi o primeiro a abir um bingo no Brasil, em 1994. Teve
investidores espanhois com ele. Só que os caras fugiram e o bingo faliu,
ou o contrário nem sei mais. Papai tinha muitos imóveis e teve de
vender vários deles para pagar as ações trabalhistas que sobraram para
ele. Honrou tudo. E ficou sem quase nada”
No “Tricolor Celeste”, Muricy deu seu depoimento sobre Pedro Rocha:
“Ele era muito educado, um cara diferente no futebol. Caladão, não
era de muita brincadeira e gostava muito de jogar sinuca. Era
invencível, tinha uma precisão para defender e atacar, até parecia que
estava jogando futebol. Para ficar perto dele, comecei a jogar sinuca
também. Melhorei muito mas nunca consegui vencer Pedro Rocha. Mas estava
ali, perto dele. Era a prova de que estava vencendo na vida. O cara era
um gênio da bola”
Muricy nunca venceu Rocha. Os zagueiros o temiam. Gerson, o grande
craque brasilieor que o ofuscou no primeiro ano juntos, em 1971, nem
teve sua saída lamentada depois que Rocha começou a brilhar sozinho.
Ninguém venceu Pedro Rocha.
A atrofia do mesaencéfalo, sim. Apesar da resistência do velho craque, a derrota é certa
Fonte: Blog do Menon